quinta-feira, 29 de maio de 2014

A Lista de Características para Escolher sua Esposa

          Não sei quantos de vocês já ouviram falar disso, mas anos atrás, quando eu era de uma igreja batista – mas praticamente pentecostal – e tinha lá meus 17 anos, durante uma das aulas dominicais, uma mulher foi lá nos ensinar que nós tínhamos que fazer uma lista de características que queríamos que nossos futuros cônjuges tivessem. Segundo ela, poderíamos incluir ali as características que quiséssemos: que fosse uma pessoa bonita, educada, bonita, inteligente, bonita, rica e até bonita. Ah, sem esquecer que tinha de ser crente também. Sério. Uma das listas que eu vi de uma menina – ela deixou - tinha três páginas e várias vezes a palavra “bonito” aparecia.

            Eu me lembro bem da reação ao ouvir sobre como poderíamos fazer uma lista contendo essas “exigências” para Deus: pareceu-me estranho querer determinar como Deus tinha que me dar uma vida fácil ao escolher uma pessoa que seria perfeita, que eu provavelmente nem mereceria ou estaria à altura, ao invés do que eu havia aprendido na Bíblia que dizia que o casamento era para a glória de Deus. Eu lembro de sonhar acordado nessa época com esposas que possuíam deficiências, físicas ou mentais, ou que fossem pobres, romantizando de forma infantil o princípio correto de que o casamento não é primeiramente  para nos fazer felizes, mas para que glorifiquemos a Deus e assim consigamos felicidade nEle. Deus me deu uma linda jovem para cuidar, com quem namoro a 491 dias – se esse texto for colocado no blog no dia 30, vai fazer 495 dias – e com quem pretendo me casar.

            Mas isso não era a única coisa que me intrigava. Ao que me parecia, Deus já havia deixado uma lista dessas, pronta, na Bíblia! Eu não precisava colocar critérios – fortemente influenciados pelo mundo, pela carne, ou por aquilo que me agradaria – pois Deus já os havia dado em Sua palavra. E é sobre essa lista que eu gostaria de falar hoje. Abra por favor, a sua Bíblia em Provérbios 31:10-31 e dê uma lida no texto.

            Vamos a algumas informações preliminares, para podermos interpretar o texto diante de nós: esse texto é um poema de 22 versos, e sua forma é utilizada também no Salmo 119 (22 seções de 8 versos) e em Eclesiastes (o número de versículos nos capítulos é sempre mútiplo de 22). Esses 22 versos são as 22 letras do alfabeto hebraico, e o objetivo de usar um acróstico com todas as letras é expressar que o texto diante de nós tenta cobrir o assunto todo que o autor se propôs a escrever, ainda que de maneira resumida.

            Bem, se você leu o texto – se não leu ainda, leia! – deve ter identificado facilmente algumas das características da mulher virtuosa. Uma mulher virtuosa não é aquela que exibe uma e outra virtude aqui e ali, mas sim uma pessoa cuja maioria das ações expressa um caráter agradável a Deus - a maioria, e não todas, pois senão teríamos um robô e não uma mulher! Vamos entender um pouco mais a fundo o texto.

            “Mulher virtuosa, quem a achará? O seu vaor excede muito o de finas jóias.” Aqui o autor estabelece tanto a raridade de uma mulher virtuosa quanto seu valor. “Finas jóias” só eram possuídas pelos reis, ou por pessoas da corte real. Ma Deus, em Sua Palavra, está nos dizendo que a esposa virtuosa está acessível mesmo a nós, e que devemos ter grande expectativa em procurá-la e achá-la. Afinal, a boa esposa é bênção do Senhor.
            “O coração do seu marido confia nela, e não haverá falta de ganho. Ela lhe faz bem e não mal, todos os dias da sua vida” Esses versos estabelecem que ela é uma mulher confiável, que incentiva o trabalho do seu marido, pois o verdadeiro ganho não é dinheiro, mas a sua esposa mesmo, ao mesmo tempo que ela mesma é trabalhadora e sábia, edificando sua casa com suas próprias mãos: “Busca lã e linho e de bom grado trabalha com as mãos. É como o navio mercante: de longe traz o seu pão.”

            “É ainda noite, e já se levanta, e dá mantimento à sua casa, e a tarefa ás suas servas.” Nesse trecho vemos que a mulher virtuosa sabe administrar a sua própria casa, “arregaça as mangas” e busca trazer prosperidade à sua casa, para que seus filhos não passem fome: “Examina uma propriedade e adquire-a; planta uma vinha com as rendas do seu trabalho”.

Ao contrário do que alguns podem pensar, a mulher virtuosa tem sim certa independência financeira do seu marido. Eu cresci em um lar onde minha mãe não trabalhava, e vi de perto um homem maltratar uma mulher por causa do amor ao dinheiro que meu pai tinha – e tem. Sem independência financeira, e com o desejo de não se divorciar para não causar problemas aos filhos, eu vi minha mãe sair da situação de refém dos ganhos do meu pai – homens, nunca façam isso com suas esposas! - fazer mestrado e doutorado, ser professora universitária e alcançar uma independência que equilibrou o lar e lhe deu poder para ser ajudadora do marido, que só recentemente descobrimos que tem síndrome de Aspenger. E é bom que a mulher seja obediente ao marido, não nego. É bom que a mulher mesmo cuide dos filhos. Mas ela também não pode se tornar escrava do seu marido por causa de dinheiro! “Cinge os seus lombos de força e fortalece os braços. Ela percebe que o seu ganho é bom; a sua lâmpada não se apaga de noite. Estende as mãos ao fuso, mãos que pegam na roca.”

Abre a mão ao aflito; e ainda a estende ao necessitado.” A mulher virtuosa não ganha dinheiro somente para si ou para seus filhos: ela corresponde às exigências da caridade cristã, auxiliando com sua renda aqueles que precisam de ajuda. “No tocante à sua casa, não teme a neve, pois todos andam vestidos de lã escarlate.” Ela veste até as suas servas com lã escarlate, uma lã trabalhada e tingida para a nobreza! Repare bem isso: a mulher virtuosa trata bem mesmo os empregados mais simples. E ao mesmo tempo sabe dar valor a si mesma: “Faz para si cobertas, veste-se de linho fino e de púrpura.”

Seu marido é estimado entre os juízes, quando se assenta com os anciãos da terra.” Por trás de um grande homem há sempre uma mulher virtuosa empurrando! A mulher virtuosa incentiva seu marido a ser virtuosa também, ela é parceira na caminhada da santificação que Deus opera em nós.

Ela faz roupas de linho fino, e vende-as, e dá cinta aos mercadores.” A mulher virtuosa faz com excelência aquilo a que se propõe fazer, e excelência é um hábito. “A força e a dignidade são os seus vestidos, e, quanto ao dia de amanhã, não tem preocupações.” Ela está revestida de caráter, e por isso não teme o amanhã, pois sabe que, mesmo nas dificuldades, com o esforço que Deus lhe dá, certamente há de superar as dificuldades, especialmente as espirituais.

Fala com sabedoria, e a instrução da bondade está em sua língua.” Quem precisa de sabedoria, deve pedi-la a Deus que a todos dá liberalmente, e não impõe nenhuma condição (Tiago 1:5); a mulher virtuosa ela ora pedindo aquilo que Salomão pediu sabedora de que será atendida.

 “Atende ao bom andamento da sua casa e não come o pão da preguiça.” Administrar uma casa dá trabalho! Mas a mulher virtuosa não busca desculpas, ela busca soluções! Por isso, o reconhecimento: “Levantam-se seus filhos e lhe chamam ditosa; seu marido a louva, dizendo: Muitas mulheres procedem virtuosamente, mas tu a todas sobrepujas. Enganosa é a graça, e vã, a formosura, mas a mulher que teme ao SENHOR, essa será louvada.” O reconhecimento não é só de seu caráter, mas também da obra de Deus na vida da mulher virtuosa: a transformação não engana, nem é essa dignidade ou graça algo artificial, mas o fruto do trabalho operado pelo Espírito Santo.


É com essa lista que você, rapaz, deve procurar uma esposa; tente ser caminhão suficiente para toda essa areia! E é sendo conforme essa lista, moça, que você se tornará virtuosa! “Dai-lhe do fruto de suas mãos, e de público a louvarão por suas obras!”

Daniel Campos

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Fé ou Arrependimento: o que vem Primeiro?

Quando o evangelho é proclamado, à primeira vista parece que duas diferentes respostas, até mesmo alternativas, são necessárias. Às vezes o chamado é “Arrependa-se!”. Assim, “apareceu João Batista pregando no deserto da Judéia e dizia: ‘Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus’” (Mt 3.1-2). Novamente, Pedro insta com os ouvintes cujas consciências foram abertas no dia do Pentecoste: “Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo” (At 2.38). Mais tarde, Paulo insta com os atenienses para se arrependerem em resposta à mensagem do Cristo ressurreto (At 17.30).
Ainda assim, em outras ocasiões, a resposta apropriada ao evangelho é: “Creia!”. Quando o carcereiro filipense perguntou a Paulo o que ele deveria fazer para ser salvo, o apóstolo disse a ele: “Crê no Senhor Jesus e serás salvo” (At 16.31).
Mas não há mistério ou contradição aqui. Mais adiante em Atos 17, descobrimos que precisamente onde a resposta do arrependimento era necessária, aqueles que foram convertidos são descritos como crentes (At 17.30, 34).
Qualquer confusão é certamente resolvida pelo fato de que quando Jesus pregou “o evangelho de Deus” na Galiléia, ele instou aos seus ouvintes: “O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho” (Mc 1.15). Aqui o arrependimento e a fé estão unidos. Eles denotam dois aspectos na conversão que são igualmente essenciais. Assim, cada termo sugere a presença do outro, pois cada realidade (arrependimento ou fé) é sine qua non da outra.
Em termos gramaticais, portanto, as palavras arrepender crer funcionam como uma sinédoque — uma figura de linguagem na qual uma parte é usada para referir-se ao todo. Portanto, arrependimento sugere fé e fé sugere arrependimento. Um não pode existir sem o outro.
Mas, logicamente, o que vem primeiro? O arrependimento? A fé? Ou nenhum possui uma prioridade absoluta? Houve prolongados debates no pensamento reformado sobre isso. Cada uma das três possíveis respostas têm seus defensores:
Primeiro, W.G.T. Shedd insistiu que a fé deve preceder o arrependimento seguindo a ordem de natureza: “Embora a fé e o arrependimento sejam inseparáveis e simultâneos, ainda assim, em ordem de natureza, a fé precede o arrependimento” (Dogmatic Theology, 2.536). Shedd argumentou isso alegando que o poder motivador para o arrependimento reside na compreensão da fé da misericórdia de Deus. Se o arrependimento precedesse a fé, tanto o arrependimento quanto a fé seriam legais em caráter, e se tornariam pré-requisitos para a graça.
Segundo, Louis Berkhof parece ter tomado a posição contrária: “Não há dúvida de que, logicamente, o arrependimento e o conhecimento do pecado precedem a fé que se entrega a Cristo em amor confiante” (Systematic Theology, p. 492).
Terceiro, John Murray insistiu que essa questão levanta:
... uma pergunta desnecessária e a insistência fútil de que uma precede à outra. Não há prioridade. A fé que é para a salvação é uma fé penitente, e o arrependimento que é para a vida é um arrependimento crente [...] fé salvífica é permeada de arrependimento, e arrependimento é permeado de fé salvífica. (Redemption — Accomplished and Applied, p. 113).
Essa é, certamente, a perspectiva mais bíblica. Não podemos separar o desviar-se do pecado em arrependimento e o converter-se a Cristo em fé. Ambos descrevem a mesma pessoa na mesma ação, mas a partir de perspectivas diferentes. Sob um ângulo (arrependimento), a pessoa é vista em relação ao pecado; de outro (fé), a pessoa é vista em relação ao Senhor Jesus. Mas o indivíduo que simultaneamente confia em Cristo se desvia do pecado. Ao crer, ele se arrepende, e ao arrepender-se, ele crê. Talvez R. L. Dabney expresse isso melhor quando ele diz que arrependimento e fé são graças “gêmeas” (talvez possamos dizer “gêmeas siamesas”).
Mas tendo dito isso, de maneira nenhuma dissemos tudo o que há para se dizer. Entrelaçada com qualquer teologia da conversão repousa uma psicologia da conversão. Em qualquer indivíduo, ao nível da consciência, pode predominar um senso de arrependimento ou de confiança. O que é unificado teologicamente pode ser psicologicamente diverso. Assim, um indivíduo profundamente convencido da culpa e da escravidão do pecado pode experimentar o desviar-se dele (arrependimento) como uma marca predominante em sua conversão. Outros (cuja experiência de convencimento se aprofunda após a conversão) podem ter um senso predominante da maravilha do amor de Cristo, com menos agonia na alma no nível psicológico. Aqui o indivíduo está mais consciente da confiança em Cristo do que do arrependimento do pecado. Mas na verdadeira conversão, um não pode existir sem o outro.
Os pontos psicológicos que acompanham a conversão assim variam, dependendo às vezes da ênfase predominante do evangelho que é exposta ao pecador (a perversidade do pecado ou a grandeza da graça). Isso é bastante coerente com o perspicaz comentário dos Teólogos de Westminster sobre o fato de que a fé (isto é, a resposta confiante do indivíduo à palavra do evangelho) “age em conformidade com aquilo que cada passagem [da Escritura] contém em particular” (CFW 14.2)1.
De maneira nenhuma, entretanto, a real conversão pode acontecer à parte da presença tanto do arrependimento quanto da fé, e, portanto, da alegria e da tristeza. Uma “conversão” em que não há tristeza pelo pecado, que recebe a palavra apenas com alegria, será temporária.
A parábola de Jesus sobre o semeador é instrutiva aqui. Em um tipo de solo, a semente brota rapidamente, mas morre repentinamente. Isso representa os “convertidos” que recebem a palavra com alegria — mas com nenhum senso de estar sendo arado pela convicção do pecado ou qualquer dor no desviar-se do mesmo (Mc 4.5-6, 16-17). Por outro lado, uma conversão que é apenas tristeza pelo pecado, sem nenhuma alegria pelo perdão, provará ser apenas “tristeza do mundo” que “produz morte” (2Co 7.10). No fim, não dará em nada.
Isso, contudo, levanta a última questão: a necessidade do arrependimento na conversão  constitui um tipo de obra que vai contra a fé sem obras? Ela compromete a graça?
Em uma palavra, não. Pecadores devem sempre achegar-se de mãos vazias. Mas esse é justamente o ponto. Por natureza, minhas mãos estão cheias (de pecado, do ego e das minhas próprias “boas obras”). Contudo, mãos que estão cheias não conseguem agarrar-se a Cristo em fé. Ao invés disso, quando elas agarram nele, elas são esvaziadas. Aquilo que nos impedia de confiar nele, inevitavelmente cai no chão. O velho estilo de vida não pode ser retido nas mãos que estão agarrando o Salvador.
Sim, arrependimento e fé são dois elementos essenciais na conversão. São graças gêmeas que não podem ser separadas. Como João Calvino bem nos lembra, isso é verdadeiro não apenas no início, mas durante toda a nossa vida cristã. Nós somos crentes penitentes e penitentes crentes durante todo o caminho em direção à glória.
Tradução: Alan Cristie


Intercâmbio feito por: Yasminn Agra

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Qual a Diferença entre o Estudo da Teologia e o Estudo da Religião? Com a Palavra, Sproul.

Esse movimento para reduzir a religião à sua essência teve um efeito sutil, porém dramático. O estudo de religião tomou o lugar do estudo de teologia no mundo acadêmico. Essa mudança foi sutil, em que, para a população em geral, religião e teologia eram a mesma coisa, portanto as pessoas não sentiram nenhum impacto dramático. Mesmo no mundo acadêmico a mudança foi aceita em larga escada, quase sem lamúria ou protesto.

Há alguns anos fui convidado a falar ao corpo docente de uma conhecida faculdade do Centro-Oeste americano com uma rica tradição cristã e reformada. O educandário estava sem um presidente e o corpo docente estava envolvido num auto-estudo para definir a identidade da faculdade. Pediram-me para falar sobre a pergunta: ¨Quais são os pontos característicos, inconfundíveis e exclusivos de uma ímpar educação cristã?

Antes da conferência, o deão me levou para visitar o campus. Quando entramos no prédio de administração dos professores, observei um escritório com estas palavras reproduzidas na porta: Departamento de Religião.

Naquela noite, quando falava ao corpo docente, eu disse: ¨Durante minha excursão pelo prédio notei a porta de um escritório que anunciava Departamento de Religião. Minha pergunta é dupla. Primeiro, aquele departamento sempre foi chamado de Departamento de Religião?

Minha pergunta foi recebida com silêncios e olhares vagos. Em princípio pensei que ninguém pudesse responder à minha pergunta. Finalmente um dos professores mais antigos da faculdade levantou a mão e disse: ¨Não, antigamente era chamado de departamento de Teologia. Nós mudamos o nome há uns trinta anos¨.

¨Por que o mudaram?¨ Perguntei.

Ninguém na sala tinha idéia alguma, nem parecia se importar. O que se deixava supor era: ¨realmente não tem importância¨.

Lembrei ao corpo docente que há uma diferença profunda entre o estudo de teologia e o estudo de religião. Historicamente, o estudo de religião tem sido incluído sob os cabeçalhos de antropologia, sociologia, ou até mesmo psicologia. A investigação acadêmica de religião tem procurado ser fundamentada num método empírico-científico. A razão disso é bastante simples. A atividade humana é parte do mundo fenomenal. É uma atividade que é visível, sujeita à análise empírica. Psicologia pode não ser tão concreta como biologia, mas o comportamento humano em resposta a crenças, ímpetos, opiniões, etc. pode ser estudado de acordo com o método científico.

Para afirmar isso de modo mais simples, o estudo da religião é principalmente o estudo de certo tipo de comportamento humano, seja sob a rubrica da antropologia, sociologia ou psicologia. O estudo de teologia, por outro lado, é o estudo de Deus. Religião é antropocêntrica; teologia é teocêntrica. A diferença entre religião e teologia é, em última análise, a diferença entre Deus e o homem – dificilmente uma diferença pequena.

Outra vez, é uma diferença de assunto. O assunto da teologia em si é Deus; o assunto da religião é o homem.

C. R. Sproul
Livro:  O que é teologia Reformada
Editora Cultura Cristã.
Paginas: 6-7


Intercâmbio feito por Jhonatas Araujo

A Culpa não foi Minha!

Há algo em comum entre o primeiro homem, Adão, e qualquer outro da presente era. Não importa o lugar nem a época, desde que o homem caiu no jardim do Éden ele sempre tenta se esquivar de suas responsabilidades(Gn.3:12,13). Desde cedo quando os pais flagram uma atitude desobediente dos filhos, estes geralmente buscam se explicar com motivações que os fazem inocentes. Toda estratégia parece ser válida para se ver livre das reprimendas. As pessoas crescem com a tendência de, sempre que confrontadas com o erro, ter como a melhor saída procurar algo que lhe sirva de "bode expiatório". Afinal, não há nada mais cômodo do que repassar a culpa adiante.
Esse sentimento é tão comum que nos dias atuais deu origem a uma grande militância. Existem pessoas que doam suas vidas com vistas a fazer uma releitura de situações onde claramente há um culpado pessoal que deveria ser responsabilizado. Contudo, para esses militantes de causas pouco nobres o que os acusados precisam ser entendidos em seu contexto. Inúmeros são os casos, como o do jovem que foi arrastado no Rio de Janeiro ao longo de vários quilômetros por ladrões em fuga desesperada, que encontraram nos grupos dos defensores dos direitos humanos (estão mais para “direitos dos manos”) aliados fieis para apresentar desculpas para uma atitude incompreensível. A estratégia é sempre colocar a culpa nos problemas sociais do país, no sistema econômico, nos empresários, na Igreja, ou em qualquer coisa, e tem que ser uma coisa (algo impessoal), que não diga respeito ao próprio acusado. Este tipo de argumento leva a conclusão que não existem responsáveis pessoais, pois a culpa é externa e foge ao controle do acusado que agora passa a ser uma vítima da situação. No final das contas, o erro reside na vítima que por algum infortúnio estava na hora errada e no lugar errado. 
Quando os olhos se voltam para Escritura no intuito de entender melhor o que a mente do Senhor pensa sobre culpa, fica claro que Ele não tem o culpado por inocente (Nm. 1:3). De fato, determinadas circunstâncias podem contribuir para que alguém cometa um delito, mas, diante do Deus da Bíblia, quem erra deve ser responsabilizado. O alerta dado a Adão se cumpriria "pois no dia que comeres do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, certamente morrerás" (Gn.2:17). Adão morreria, não outro! Todavia, o Senhor sendo infinitamente misericordioso, desde a eternidade, decidiu salvar alguns desses culpados. Entretanto, não se utilizando de estratégias ímpias como as citadas no início deste texto. Deus providenciaria alguém que pudesse satisfazer a sua Santa Justiça. A Sua lei diz que o pecado leva a morte, portanto, alguém teria que morrer. 
O Senhor, ainda prefigurando o que ocorreria mais adiante na revelação, institui sacrifícios de animais que serviriam de substitutos para a morte dos verdadeiros culpados. O animal seria morto para satisfazer a justiça do Justo Juiz. Entretanto, o sacrifício do animal que em algumas ocasiões era efetuado no meio da congregação (Ex.12), em outras oportunidades era realizado fora. Na cerimônia do dia de purificação, após o ritual da transferência dos pecados, era lançado o animal para longe da congregação (Lv.16). A culpa de todo israelita era posta sobre e o bode que carregava para longe da comunidade as iniquidades, prosseguindo para morrer sozinho no deserto. Tal instituição divina, como se pode perceber, não invalida a lei, nem muito menos declara o culpado como inocente sem que a pena seja aplicada em alguém, inicialmente no animal que apontava para um ser pessoal e humano, Cristo. 
Portanto, há uma imensa diferença entre desviar a culpa para outrem de uma forma que ninguém seja penalizado, e aplicar a lei, mesmo que a um substituto. No primeiro caso o final é a injustiça e a conivência, no segundo é justificação e cumprimento da lei. Deus, em Cristo, cumpriu a lei no lugar do seu povo. Alguns ímpios que mereciam a morte eterna foram declarados justos pela justiça do perfeito cordeiro de Deus (Jo.1). A lei foi plenamente aplicada em Jesus. Toda a ira Santa de Deus foi derramada sobre Cristo para que o que Nele crer não pereça, como perecia o bode expiatório no deserto, mas tem a vida eterna (Jo.3:16). Percebe-se, então, que buscar desculpas externas para invalidar a lei é estratégia ímpia e que apenas reflete o estado espiritual do presente século, assim como no Éden. Diante de Deus a única forma de não receber sobre si o castigo da lei é tendo fé no substituto que morreu no lugar dos seus, pois sua justiça é imputada a todo que em sua obra manifestar fé.
Rev. Augusto Brayner (IPAB)
Redação apresentada ao Mestrado em Divindade com Ênfase em Pregação da Universidade Presbiteriana Mackenzie (CPAJ-SP).


quarta-feira, 21 de maio de 2014

Começando uma Discussão sobre Ética Cristã

É interessante notar que, apesar de este tópico ser acerca da ética filosófica, precisamos pensar sobre ele pelo viés da cosmovisão cristã. Sendo assim, temos que conceber o homem criado, em comunhão com Deus e com sua razão completamente alinhada ao ideal criador (Gn 1 e 2). Com a queda (Gn 3), isto é manchado, totalmente afetado pelo pecado. O homem  busca, a partir da razão, a afirmação que ele tinha quando do alinhamento de sua razão com o Criador. Neste aspecto, a razão torna-se incapaz de fazer este realinhamento. Por isso, vemos, no decorrer da história, tantas linhas de pensamentos tentando definir a melhor maneira do homem pensar, agir e reagir no e sobre o mundo. E sendo assim, o homem vem a tornar-se o centro do pensamento, desvinculado da ideia de um criador e ser supremo e sobreano sobre todos. Na prática, isto acontece quando o homem, destituído da glória de Deus (Rm 3.23) não o glorifica por seus atos e feitos. Ao contrário, glorifica a sim mesmo e diz, com estas ações como prevê o salmista no salmo 14 (diz o insensato no seu coração: Não há Deus).  Enquanto o homem pensar que toda ética proposta deve ter como centro o próprio homem, seu bem estar, sua felicidade, autonomia, liberdade e independência, haverá sempre frustração, desencontro e morte, pois estes atos comprovam a rebeldia de nosso coração e idolatria , fazendo de nós nossos próprios deuses. E aí entramos num ponto interessante. Se houve a criação e a queda, houve também a redenção. E é nesse princípio que, como cristãos,precisamos enxergar esta produção filosófica. Temos que redimir o conhecimento por meio do Evangelho e submeter toda e qualquer proposta ética às Escrituras, que apresentam os princípios éticos santos e oriundos do santo Deus, para que assim, rendamos a devida glória a Ele (1 Co 10.31) e testemunhemos da graça salvadora em Cristo Jesus. 

O pensamento cristão, assim como todas as outras áreas da vida cristã, deve glorificar a Deus ( 1Co 10.31) e testemunhar da redenção em Cristo Jesus. Devemos reconhecer que a capacidade de produzir conhecimento vem de Deus (Ex 31.2-5, Gn 4.20-22) e o único ato devido é de honrá-lO com este conhecimento, mostrando assim que este era o propósito de Deus para o homem antes da queda e que os homens podem voltar a ter este relacionamento com o Pai por meio do Filho. Assim devemos observar todas as contribuições dadas no decorrer da história sob a ótica das Escrituras e assim construirmos nossas  ideias e embasarmos nossas ações com o fim de glorificar a Deus, longe de legalismo (evangelho do pode e não pode) e do liberalismo (pode tudo). Toda produção de conhecimento e toda prática, que aliada ao pensamento, reflete nossa ética e cosmovisão deve ser como base as Escrituras, e o princípios de que tudo posso, mas nem tudo convém deve permear nossa consciência , que deve ser cativa a Cristo. Não podemos ignorar o que tem sido concedido pela graça comum. Em contrapartida, não podemos assimilar inverdades. 

Calvino , ao estabelecer as bases de sua ética cristã , o faz em pressupostos bíblicos. Precisamos compreender o alcance temporal da Palavra de Deus. Isto é, o que era verdade bíblica no tempo de Calvino, o é ainda hoje. Sendo assim, é totalmente aplicável visto que: 1) O governo deve ser visto como algo bom e que tem como objetivo, segundo as Escrituras, promover o bem (leis justas e justas aplicações dos impostos) e punir o mal (exercício da justiça), este deve ser o foco do nosso alvo ao olhar para o governo a fim de aprová-lo ou reclamar contra o mesmo; 2) A prática do trabalho como maneira de render graças a Deus deve ser enfatizada e vivida pelos cristãos, pois a partir do mesmo, refletimos a graça de Deus, que o sustento e condições de cuidar dos nossos e dos pobres e necessitados. Se considerarmos estes pontos e observarmos que, quando Calvino aponta sua ética, ele ão está falando em puro assistencialismo, mas em o homem perceber-se como individuo indissociável de uma sociedade e que tudo que ele faz e ´produz é construção humana e social, sendo assim, manchada pelo pecado. Sendo assim, com o foco em Deus, buscamos exercer fielmente o mandato cultural e transformar (redimir) as relações por meio do Evangelho.

Por fim, só há dois caminhos. Uma ética pautada em Deus e na sua revelação (Escrituras) ou uma ética pautada na autonomia humana (cada um ou cada grupo com seu sistema ético de normas e valores). Precisamos compreender o ponto mais importante de qualquer sistema ético: o pressuposto. Sendo assim, ou reconhecemos Deus como criador a quem devemos submissão e pautamos nossa ética nas Escrituras ou pautamos nossa ética no antropocentrismo, fazendo do homem o fim de todas as coisas. 

Presb. Cícero Pereira


segunda-feira, 19 de maio de 2014

Os Filhos não Estão à Procura de Pais Perfeitos

Embora nossos filhos aprendam a partir do que dizemos, eles aprendem ainda mais através do que somos e do que fazemos. Nossa fé, nossa oração, nosso ensino e nossa vida devem ser partes de um conjunto harmonioso. Sendo assim, a implementação do nosso ensino como pais-profetas necessita ser moldada por Deus.

O principal modelo piedoso para nós como pais-profetas é o Senhor Jesus, o qual superou todos os outros como um verdadeiro profeta, professor, pescador de homens  e fazedor de discípulos. Agimos bem ao fazermos um estudo particular dos Evangelhos com os olhos em como Cristo andou treinando seus discípulos. Um bom professor procura por bons modelos e se esforça constantemente para aprimorar suas habilidades e melhorar seus métodos. Cristo nos oferece o melhor modelo e abundantes recursos aos quais podemos recorrer à medida em que assumimos o tarefa de ensinar e treinar nossos filhos.

Os filhos não estão à procura de pais perfeitos, e eles são incrivelmente generosos. Eles têm uma maneira incomum de saber quem seus pais são e o que eles representam. É difícil guardar nossos segredos de alguém quando vivemos sob o mesmo teto. Nossos filhos estão sempre lendo o livro da nossa vida. Além da Bíblia, a maneira como vivemos a nossa fé dia após dia é o livro mais importante e que sempre será lido por nossos filhos.

O que as crianças precisam ver não é uma mãe perfeita ou pai perfeito, nem, certamente, uma mãe ou pai que nunca dizem: "Eu sinto muito." Eles precisam ver em nós um compromisso inabalável com Jesus Cristo, um amor incondicional por eles, e um forte vínculo amoroso um para com o outro como marido e mulher . Eles precisam ver a mãe e o pai trabalhando ombro a ombro, dos quais as crianças podem dizer : "Minha mãe e meu pai odeiam o pecado, eles amam a Deus, e sua única esperança está em Cristo Jesus. Eles querem, com tudo o que há neles, viver uma vida santa e piedosa . Eu posso ver isso, eu posso sentir isso; Eu sei que é verdade e que é real, e eu quero ser como eles. Eu quero que o Deus do meu pai e da mãe seja o meu Deus." Em particular, o modelo piedoso deve inculcar lentamente nos filhos a convicção de que a vida cristã é um modo de vida o qual proporciona a verdadeira alegria, o verdadeiro propósito e significado da vida, e despertar neles uma espécie de ciúme santo a fim de quererem essas coisas para si mesmos. Conforme nossos filhos leem o livro da nossa vida, eles aprendem como Deus, Cristo, a Bíblia, a fé , a oração e a adoração em família são importantes para nós.

Texto original disponível em: http://www.ligonier.org/blog/children-are-not-looking-perfect-parents/ POR: JOEL BEEKE / 10 de maio de 2014.

TRADUZIDO E EDITADO POR LETÍCIA LIMA

               https://www.facebook.com/leticiaa.limaa

O Padrão Fifa e o Padrão Cristão de Qualidade

E tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como ao Senhor,
e não aos homens (...) Cl 3:23

Os preparativos para o mundial de futebol que acontece aqui no Brasil tem sido um dos assuntos mais discutidos em nossos dias. Todos ficamos impressionados com o nível de exigência da Fifa (Federação Internacional de Futebol) com os preparativos para a realização do grande evento esportivo. Tal grau de perfeccionismo exigido acabou por popularizar em nosso país o termo “Padrão Fifa de Qualidade”.

Como cristãos nós também possuímos um excelente Padrão de Qualidade!

 A Bíblia nos chama atenção quanto à necessidade de sermos zelosos no desempenho de nossas tarefas como um todo: "Portanto, quer comais quer bebais, ou façais outra qualquer coisa, fazei tudo para glória de Deus" (1Co 10.31). O sistema calvinista observa que o cristão não deve fazer distinção perante seus afazeres, entendendo que tudo deve ser feito visando a glória de Deus em todo e qualquer empreendimento realizado. Sendo igualmente importantes todos os afazeres, das mais simples às mais complexas atividades, remuneradas ou voluntárias, profissionais ou recreativas.

Este padrão de qualidade é norteado por uma concepção correta de qual seja o propósito da vida humana, fazer tudo para o Senhor (Rm 14:7) e glorificá-lo nos mais diversos âmbitos de suas ações. Este é naturalmente o agente propulsor de todos os nossos afazeres.  E este entendimento desfaz por completo o pensamento daqueles que equivocadamente tratam de forma diferenciada suas ocupações, julgando-as por menos ou mais importantes.

Existem crentes que pensam que atividades tidas como secular, como trabalhar, e estudar, por exemplo, podem ser feitas de qualquer jeito, superestimando apenas os trabalhos desenvolvidos na Igreja; outros, por sua vez, dão maior ênfase às atividades mundanas, sendo relapsos quanto as funções eclesiásticas.

Mas a Palavra de Deus não faz este tipo de distinção, mas encoraja a fazer tudo “como ao Senhor” e para a glória de dEle, e isto incluiu toda e qualquer ação do cristão, como bem afirmou Willian Tyndale: “Há uma diferença entre lavar louças e pregar a palavra de Deus; mas no tocante a agradar a Deus; nenhuma em absoluto” [1].

Nosso trabalho deve ser feito com tal empenho perante os homens que estes glorifiquem a Deus por meio de nosso labor:  “mantendo exemplar o vosso procedimento no meio dos gentios, para que, naquilo que falam contra vós outros como de malfeitores, observando-vos em vossas boas obras, glorifiquem a Deus no dia da visitação”. (1 Pe 2:12). Portanto, nosso exemplo de competência e submissão na vida profissional, bem como nosso zelo no lar, e dedicação nos estudos e em todos os demais âmbitos de nossas ações devem culminar em honras e louvor ao Criador. Nossa fé deve nos encorajar a realizar com máximo de diligência tudo aquilo que nos foi confiado. Sendo desprezível, pecaminoso e inconcebível todo desleixo e falta de empenho nas obras para as quais o Senhor nos designou, seja na Igreja ou fora dela.

Que Deus nos ajude para que nosso padrão de qualidade seja por demais elevado, e que esta consciência de estarmos sempre fazendo tudo “como se fosse pra Deus”, aumente sobremaneira nossos esforços. Afinal de contas, se homens buscando sua própria glória empenham todas suas aptidões e talentos fazendo o melhor que podem, temos motivos de sobras para fazermos todas nossas tarefas com muito mais excelência, pois a glória de Deus é nosso objetivo maior. E que motivação nós temos! Se levarmos isto realmente a sério, nenhum Padrão Fifa será mais elevado quanto o Padrão Cristão de Qualidade.


[1] RYKEN, Leland. Santos no Mundo: Os Puritanos como Realmente eram. 2. Ed. São José do Campos, SP: Editora Fiel, 2013. pp. 61,62.

Ericon Fábio

sábado, 17 de maio de 2014

O Conceito Bíblico de Casamento é Fruto de um Cultura Obsoleta e Retrógrada, e por isso não se Aplica à nossa Realidade Social? Com a Palavra, Tim Keller.


Aquilo que a Bíblia ensina sobre casamento não reflete meramente o ponto de vista de uma cultura ou de uma época. Os ensinamentos das Escrituras desafiam a narrativa da nossa cultura ocidental contemporânea da liberdade individual como único caminho para a felicidade. Ao mesmo tempo, confrontam o modo de as culturas tradicionais verem os solteiros como seres humanos incompletos. O livro de Gênesis analisa de modo radicalmente crítico a instituição da poligamia, embora fosse uma prática cultural aceita na época, ao pintar um retrato vívido das desgraças e desintegrações que ela provoca nos relacionamentos familiares, e a dor que ela causa, principalmente para as mulheres. Os autores dos livros do Novo Testamento causaram espanto no mundo pagão ao exaltar a condição duradoura de solteiro como moda de vida legítimo. Em outras palavras, os ensinamentos dos escritores bíblicos desafiavam constantemente suas próprias crenças culturais, e portanto, não eram produtos de meras tradições e prática antigas. Logo, não podemos descartar a visão bíblica como um conceito unidimensionalmente retrógrado  ou culturalmente obsoleto. Pelo contrário, é repleto de ideias e soluções práticas e realistas, bem como de promessas maravilhosas sobre o casamento. E tudo isso é apresentado não apenas na forma de proposições claras, mas também de narrativas vívidas e poesias comoventes. A menos que você consiga olhar para o casamento através das lentes das Escrituras, e não de seus próprios medos ou de seu romantismo, de suas experiências pessoais ou da perspectiva limitada de sua cultura, não será capaz de tomar decisões inteligentes a respeito de seu futuro conjugal.

FONTE: O Significado do Casamento. Timothy Keller e Kathy Keller, tradução de Suzana Klassen. Edições Vida Nova, 2012. Páginas 20 a 22.

Rodrigo Ribeiro

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Distante do Trono: De um Extremo ao Outro...

           Em setembro de 2013, uma série de coisas começou a mudar em minha vida. É que foi nesse período que após reconhecer um grave pecado de foro intimo, porém com conseqüências públicas, decidi confessá-lo publicamente e utilizar minha confissão para ajudar outras pessoas a vencerem esse mesmo pecado. Fui eu quem escrevi o texto “Distante do Trono: confissões de um ex-valadete”¹ e expus como a “adoração” se tornou um ídolo em meu coração. Entretanto, como afirmou João Calvino, o coração do homem é uma fábrica de ídolos e após derrubar o ídolo da adoração, percebi que eu ainda diversos outros ídolos que me mantinham “distante do trono” e é sobre isso que eu gostaria de escrever, sobre como tudo coopera para o bem daqueles que amam a Cristo, até mesmo os seus piores pecados, até mesmo os seus ídolos.

            Durante 10 anos da minha vida acompanhei o Ministério de Louvor e Adoração Diante do Trono e nesse período me envolvi diretamente com uma série de ensinos teológicos errôneos. Primeiro, foi a minha concepção errada de adoração, mas logo em seguida abracei um conceito ainda mais errado do que seria o Reino de Deus e isso me trouxe consequências nefastas. O Diante do Trono e a Igreja Batista da Lagoinha são hoje os maiores expoentes de um movimento herético chamado “Nova Reforma Apóstolica”. Segundo esse movimento surgido nos Estados Unidos a partir de Peter Wagner, é dever da Igreja ao cumprir a Grande Comissão não apenas pregar o Evangelho, mas dominar o mundo a partir da conquista dos sete montes de influência da sociedade. O que se daria através da batalha espiritual, instituição de uma forma de governo eclesiástica baseada na ordenação de apóstolos, atos proféticos, adoração espontânea e ativismo político. É que chamam de dominialismo.

            Esse é um movimento que tem se espalhado por todo mundo de forma impressionante e exatamente por isso que me parecia ser algo tão bom. Durante muito tempo, mesmo não concordando com algumas posturas da Ana Paula Valadão, eram esses ensinos que ainda me faziam ter proximidade com o Diante do Trono. Eu já estava totalmente envolvido com esses ensinos através de ministérios internacionais como o Jesus Culture e a Bethel Church, bem como pregadores como o Bill Johnsom, Cindy Jacobs e Che Ahn e via na Lagoinha o único expoente disso no Brasil.

            Como eu já escrevi em outro texto, o que me fez não mais ouvir Diante do Trono foi perceber que as minhas concepções de adoração e culto eram erradas, mas ainda assim não conseguia conceber que também tinha uma visão distorcida do que era o Reino de Deus e qual a função da Igreja. Assim, ao adotar a teologia reformada, terminei enveredando por outro extremo, ao ter contato com um ensino chamado de “Teonomia” ou “Teonomismo” que defende um cumprimento preterista do Apocalipse, adota uma visão escatológica pós-milenista e advoga a aplicação da lei mosaica às sociedades atuais. Lembro-me que ao ter contato com os ensinos de Gary North e Rousas Rushdoony que defendem a teonomia, eu fiquei maravilhado, pois era exatamente aquilo que eu mais apreciava na Nova Reforma Apostólica e agora estava disponível para mim com uma roupagem reformada por assim dizer. Por mais que muitos teonomistas tentem negar isso, o dominialismo apostólico moderno foi totalmente embasado na obra de Rushdoony. Digo isso após ter lido obras de ambas as vertentes e há um livro da Cindy Jacobs, por exemplo, em que ela cita diretamente a obra de Gary North e de Rushdoony.

            O fato é que tais ensinos foram para mim um verdadeiro abismo teológico. Eu passei a achar que o Reino de Deus deveria ser imposto aqui na Terra a partir dos meus próprios esforços e isso justificaria o fato de eu me envolver diretamente com política, adotar uma agenda conservadora de Direita, declarar guerra ao Islã e defender a pena de morte aos gays de Uganda. Tudo isso fez com que mesmo sem eu perceber, eu me tornasse um fariseu hipócrita tão deplorável e fanático quanto os extremistas islâmicos que eu sempre condenei. Eu percebi que eu estava buscando não ser um seguidor de Cristo, mas um membro da Cristandade.

            Pensar sobre isso é algo que muito me entristece, pois sou lembrado de quantas pessoas eu feri por agir assim e quanto escândalo eu trouxe ao Evangelho. Mas acima de tudo isso me faz chorar porque me mostra que a razão de eu ter abraçado tudo isso foi a minha insatisfação com Cristo. A cruz de Cristo se tornou insuficiente em meu coração. É por isso que eu desejava aplicar a Lei de Moisés à sociedade. O Evangelho não era mais a única solução para os problemas do homem. Era preciso conquistar e reformar a sociedade por completo, como se Cristo não fosse soberano o suficiente para fazer isso por si mesmo quando lhe aprouvesse.

            Mas logo após todas essas lágrimas de tristeza pelo pecado, meus olhos se enchem de lágrimas de gratidão a Deus por Sua graça e soberania sobre a minha vida. Hoje ao olhar para tudo isso, consigo perceber o quanto Deus usou os meus piores ídolos para a Sua glória e para o meu bem. Hoje ao olhar para minha vida percebo que cada ídolo desses que Deus permitiu que eu tivesse foi uma forma que Ele encontrou para me manter junto dEle. Durante os meus anos de adolescência, minha idolatria pela adoração fez com que eu continuasse na Igreja e sempre buscando a Deus, mesmo que de forma errada muitas vezes. Nos meus anos iniciais de universidade era necessário que eu fosse um fundamentalista cristão e não cedesse ao relativismo marxista com o qual tentaram me doutrinar. Sem falar que foram essas as circunstâncias que Deus utilizou para me dar grandes amigos que são verdadeiros irmãos e uma igreja que não apenas me acolheu de braços abertos, como também tem me dado inúmeras oportunidades de servir a Deus, me lembrando sempre que a verdadeira ortodoxia só faz sentido havendo amor e piedade. Se um dia eu não tivesse tido a coragem de confessar o meu pecado, talvez eu não tivesse vivido tudo isso.

            Assim, valeu a pena os 10 anos de cegueira ouvindo Diante do Trono, o envolvimento com os falsos ensinos da Nova Reforma Apostólica e o fundamentalismo impiedoso que a teonomia teve em mim. Pois foi essa a forma que Deus usou para ser glorificado na minha vida, me mostrando que todas as coisas cooperam para o meu bem, até mesmo os meus piores pecados.

            Muitas vezes ao reconhecermos o nosso pecado e recebermos o perdão de Deus somos tentados pelo Diabo a nos sentirmos culpados por algo que Cristo já pagou por nós. Somos tentados a esquecermos que Cristo já suportou a vergonha da cruz que fôssemos livres do nosso pecado. Durante muito tempo eu experimentei esses sentimentos ao olhar para os erros que cometi no passado, mas ser lembrado que Deus é soberano e que determinou cada passo da vida – inclusive os meus pecados – a fim de glorificar o Seu nome é o que me alegra.

“E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito.” (Romanos 8:28)


1. http://colunas.gospelmais.com.br/distante-trono-confissoes-ex-valadete_6113.html

Igor Sabino
Facebook: https://www.facebook.com/igorhsabino

quarta-feira, 14 de maio de 2014

A Prioridade da Obediecência

Porém Samuel disse: Tem porventura o SENHOR tanto prazer em holocaustos e sacrifícios, como em que se obedeça à palavra do SENHOR? Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar; e o atender melhor é do que a gordura de carneiros. (1 Samuel 15.22)

 Todos nós conhecemos a história. O Rei Saul recebeu a ordem de não tomar despojos dos amalequitas, mas destruir tudo, incluindo os animais. Quando o profeta Samuel descobriu que Saul tinha poupado muitos animais para o seu próprio uso, ele o condenou firmemente por sua desobediência. O Rei Saul tentou justificar suas ações dizendo que tinha guardado os melhores dos animais a fim de usá-los para as ofertas de sacrifício a Deus. Pouco impressionado, Samuel fala no lugar de Deus: “Obedecer é melhor do que o sacrificar”. E como resultado da “rejeição” de Deus por Samuel, Deus rejeitou Samuel — seu reino seria tomado e dado a outro.
Mas observe as palavras de Samuel — Obedecer é melhor do que o sacrificar”. Sem dúvida, em certo nível, e pensando nisso à luz da revelação mais completa do Novo Testamento, percebemos que se não há sacrifício para o pecado, não temos nada em absoluto. Nesse sentido, não existe nada mais importante que o sacrifício.
Mas não é isso o que Samuel tinha em mente. Saul tinha oferecido sacrifício ao Senhor — e isso é algo bom! Mas nessa ocasião Deus rejeitou o sacrifício. A adoração de Saul era inaceitável. Por quê? Porque a desobediência de Saul ao mandamento de Deus mostrou que sua “adoração” era uma farsa. Deus não aceitará a adoração do desobediente.
Dois pontos principais de aplicação emergem a partir disso. Primeiro, Deus espera que o obedeçamos, e nos considera responsáveis aqui. Deus não oferece sugestões. Ele dá mandamentos. E nós, suas criaturas, somos obrigados a obedecê-lo. Não devemos selecionar e escolher — devemos obedecer!
Segundo, não devemos fingir que adoramos a Deus, se não obedecemos aos seus mandamentos. Podemos ir com a maré — ir na igreja, dar o dízimo, cantar os hinos, orar — mas se formos desobedientes, nossa adoração não será aceitável.
Isso é fascinante e de significado imenso, e é um corretivo muito necessário para o nosso pensamento natural. Quando pecamos — desobedecemos à Palavra de Deus — nossa tendência, em vez de se arrepender, é justificar esse pecado envolvendo-nos ainda mais fortemente na adoração. Asseguramo-nos de ir à igreja. Cantamos os hinos de coração. Damos dinheiro extra na hora das ofertas. E, talvez inconscientemente, queremos pensar que tudo isso compensa o pecado, que de alguma forma nossa boa adoração compensará a nossa desobediência. Mas podemos estar certos que Deus não é tão facilmente enganado. Nem ele é tão facilmente subornado.
Mais tarde na história de Israel o profeta Isaías condenou a nação por sua adoração. Ele condenou seus sacrifícios e ofertas — tudo o que Deus ordenou! Mas era tudo uma farsa, um ritual vazio e insincero, pois eram um povo desobediente.
No Novo Testamento o apóstolo faz o mesmo. Ele diz aos coríntios que a sua observância da Ceia do Senhor tinha trazido sobre eles o desprazer e a disciplina de Deus. A forma como eles estavam tratando uns aos outros na congregação era pecadora, e assim, a adoração deles era indigna de Deus. Aqui novamente a adoração é de acordo com o mandamento de Deus, mas foi rejeitada por causa de desobediência.
Tudo isso para dizer que Deus espera sinceridade na adoração. Não ousemos brincar com ele. Não podemos selecionar e escolher quais leis obedeceremos. E tendo desobedecido a Deus, não finjamos adorá-lo. Deus exige sinceridade na adoração!
Fred Zaspel
Tradução: Felipe Sabino—  janeiro de 2012.
Fonte da tradução: http://www.monergismo.com/fred-zaspel/a-prioridade-da-obediencia/

Intercâmbio feito por Lídia Santos

terça-feira, 13 de maio de 2014

Lendo Sistematicamente a Grande História

Quando você pega um livro para ler que não seja a Bíblia, você não costuma começar no meio. Especialmente se o livro tem um enredo, você não vai pular a esmo de capítulo para capítulo. No entanto, essa é a forma que muitos de nós lemos a Bíblia.

Não nos damos conta de que a Bíblia tem um enredo. É uma história. É a grande história de redenção, uma história que tem um começo, um meio e um fim. É a história de um Deus que criou o homem para a comunhão com Ele e, em seguida, viu quando o homem rejeitou. Como Deus coloca em prática um plano que Ele havia planejado na eternidade passada para restaurar o homem à comunhão com Ele, Deus enviou Jesus para trazer esse plano através de Sua morte na cruz.

Assim, vemos a história de Deus, mas você não pode obter toda a história se você está apenas pegando peças aqui e ali e não tem a obtenção de um sentido do todo. É por isso que eu quero encorajá-lo a ler a Bíblia, não só em espírito de oração e cuidadosamente, mas também de forma sistemática.

Isso não significa que a Bíblia só pode ser lida em linha reta através do Gênesis ao Apocalipse, embora muitas pessoas tivesse encontrado grande bênção na leitura da Escritura que forma em uma base regular.

Leitura sistemática significa que compreendemos que contexto e fluxo são importantes. Versos individuais precisam ser lidos no contexto do parágrafo e capítulo em que eles aparecem. Os capítulos da Bíblia precisam ser lidos no contexto do livro em que eles são encontrados. E os livros da Bíblia precisam ser lida no contexto de outros livros da Bíblia, para se ver como eles se encaixam no esquema, fluxo e enredo da Escritura e do plano redentor eterno de Deus.

Para mim, pessoalmente, para manter a grande imagem na mente, eu gosto de sempre estar lendo no Antigo e no Novo Testamento, ao mesmo tempo. Existem várias razões para isso.

Uma delas é que o Antigo Testamento brilha a luz sobre o Novo Testamento, e vice-versa. Você pode entender melhor cada um à luz do outro. É mais fácil ver as conexões entre os dois quando você está lendo os dois ao mesmo tempo.

Além disso, eu não gosto de ir por longos períodos de tempo sem ler nos evangelhos. É aí que temos a imagem mais nítida, mais focada de Jesus.

Existem maneiras diferentes de olhar para a Escritura. Um seria sob um microscópio e o outro seria através de um telescópio. Quando olhamos para a Palavra de Deus sob um microscópio, podemos optar por ler uma pequena porção das Escrituras cada dia, meditar cuidadosamente sobre cada palavra e cada frase, dissecando-a e digerindo-a com cuidado.

Uma maneira de fazer isso é ter um livro específico da Bíblia e apenas saturar-se nesses capítulos por algumas semanas. Colocá-lo sob um microscópio. Mergulhe-se na mesma. Talvez pegar um dos livros mais curtos da Bíblia e lê-lo todos os dias durante 30 dias, pedindo a Deus para lhe dar uma visão mais profunda no coração e na mensagem do livro em questão ou parte das Escrituras.

A outra maneira de olhar para a Palavra de Deus é através de um telescópio. Desta forma, você está cobrindo mais terreno mais rapidamente. Você está procurando largos, temas abrangentes para ver os fios que vão do Gênesis ao Apocalipse. Você está recebendo uma visão panorâmica do plano panorâmico de Deus. Você verá que os temas que percorrem a Escritura são como fios de uma tapeçaria que são tecidas em conjunto para formar uma grande história de redenção.

Enquanto você lê com o que significa que você está usando, não desanime. Lembre-se que nem todo dia será uma festa espiritual mais do que todas as refeições que você come é um banquete delicioso.

Algumas passagens vão provar mais como papelão que o mel. Mas o valor e o impacto da Palavra de Deus em nossas vidas não podem ser visto no que lemos em apenas um dia ou uma semana, assim como o valor de uma dieta equilibrada nutritiva não é geralmente experimentado em um dia ou uma semana. Pelo contrário, os efeitos cumulativos e benefícios de comer direito são experientes ao longo de um período de tempo prolongado.

Quer se trate de fácil leitura ou não, a Palavra de Deus ainda é rentável. Mesmo aquelas passagens que são as mais difíceis de entender, ou parecem ser relativamente pouco valor, pode ter uma santificação, limpeza, com vencimento efeito quando entram em nosso sistema.

Não se deixe tornar-se um escravo do método. Não fique tão preso a mecânica de como você está lendo a Bíblia que você pode perder o ponto. Lembre-se o objetivo não é o quão rápido você pode obter através da Bíblia. O objetivo é encontrar-se com Deus todos os dias. É para obter a Palavra - vivendo-a, Palavra escrita para você cultivar um relacionamento íntimo com Jesus, a Palavra viva.

Traduzido e Editado por:
LARYSSA LOBO

Publicação Original: https://www.reviveourhearts.com/articles/systematically-reading-grand-story/

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