Faz tempo que não ouço a música denominada Gospel. Muito embora o meu repertório seja bastante eclético, passeando do Tango ao Reggae, do Samba ao Jazz, confesso que quando o assunto é música cristã (ou para muitos, Música Gospel) eu continuo a me deleitar dos mesmos discos de antigamente, com exceção de algumas novidades que por meio de pesquisa acabo descobrindo.
Como ainda trabalho na área musical na comunidade em que congrego, e esporadicamente tenho visitado algumas igrejas no Estado em que vivo, percebo o quanto os repertórios musicais são praticamente iguais quando se chega ao tal momento de louvor.
Ultimamente visitei várias igrejas, dentre elas batistas, presbiterianas, pentecostais, congregacionais e assisti até cultos “On Line” em tempo real, de igrejas neopentecostais. Com raras exceções de momentos específicos onde se cantava uma canção do “Hinário antigo” o restante da parte musical foi bastante recheada daquelas canções que tem o incrível poder de: ou encharcar o irmão da fumaça e o levá-lo ao “Santo dos Santos” em delírios, embora pessoais, mas esquisitos; ou perfurar a mente alheia com notas musicais que se repetem eternamente a ponto de a letra cantada ser o que menos chama atenção diante do tamanho incômodo – mantra melódico “apelacional”.
Para um leigo musical, tudo bem. Ele pode até adorar ao ouvir aquele mantra, e pode até compreender o conteúdo da canção, caso esta não objetive apenas tirar o pé do chão. Mas, pra quem não pretende viver na mediocridade, e que há anos vem acompanhando esta ‘involução’ musical midiática, não é tão simples ver tamanha pobreza musical e achar tudo normal.
Nas minhas impressões, suposições, ou coisa do tipo, imagino que alguns grupos musicais, após levarem puxões de orelhas de suas lideranças quanto ao conteúdo teológico das canções, têm sido mais prudentes em relação a este item. Mas, venhamos e convenhamos, ainda acho que apenas observar a qualidade do conteúdo não quer dizer que a coisa está resolvida.
Os grandes estudiosos da música elencam que é necessário que haja uma relação equilibrada entre forma e conteúdo – como por exemplo, cantar uma letra que fala de alegria numa base harmônica tensa, com ritmo down deixa a coisa contraditória não é? Veja aonde quero chegar: a forma em muitos casos tem suprimido o conteúdo, acredite! Sabe aquela história que, de ‘tanto ouvir ruído do ventilador, nem o percebi enquanto lia um livro’, ou ‘de tanto gritarem ininterruptamente nem entendi o que diziam’? – João Alexandre chamou isso que tentei discorrer de “Meras Repetições”.
Talvez você discorde de tudo que escrevi, ou a trate como irrelevante, tudo bem, esse é um direito seu, já que tratamos com um pouco de subjetividade, no entanto, enquanto músico, micro-pesquisador, e com sinceras motivações para a área musical e artística cristãs, sonho ainda que os nossos ajuntamentos comunitários sejam repletos de autenticidade, simplicidade e criatividade – com equilibrio entre forma e conteúdo.
Diante deste tema, o que tenho notado é um certo despercebimento da Verdade cantada em virtude desta estar atrelada a uma relação pobre (quando viciada) entre forma e conteúdo. Diretamente ligado a esta problemática, diagnosticamos como uma das causas, a “febre” das canções traduzidas (de preferências originadas do grupo Hillsong – que não tenho nada contra) e “estouradas” nos repertórios das estrelas do Gospel.
Traduzindo, o que discorri em termos mais práticos vejamos abaixo:
- Faça o seguinte, pegue aquela sequencia de quatro acordes: D | A | Bm | G | + um “Loop melódico” (de preferência do Hillsong) + letra traduzida e com repetição de poucas palavras no refrão + Compasso 4/4 + metrônomo 70 + Ritmo de Balada + Voz genérica + frases introdutórias sobre qualquer besteirol + uma guitarra rotativa com 123 repetições de notas agudas e…Booommm.
Olha só, esta forma tem feito mais gente chorar e se arrepiar do que as verdades eternas de Deus lidas e pregadas. Numa outra direção, esta forma também tem desacostumado a igreja local a se relacionar com outras concepções musicais.
Meu discurso não é segmentador. Não tenho nada contra uma canção que contenha os elementos citados acima, mas tenho tudo contra o vício da forma. Ou não foi o que ocorreu quando surgiram milhares de “Anas Valadetes” ministrando louvores nos domingos a noite pelo Brasil? Não tem como discordar que o encantamento pela forma, modelo (na maioria das vezes assediada pela mídia), muitas vezes arranca de nossa comunidades a autenticidade e liberdade musical e artística.
Não quero ser generalizador. Mas, diante dos desencontros que mencionei entre forma e conteúdo, da mediocridade musical e do vício da forma, somos nós que temos o dever de tentar mudar, pelo menos a nível local esta situação.
Líderes de igrejas:
- Estimulem seus músicos a estudarem música
- Sugiram repertórios ecléticos que abarquem toda uma diversidade de estilos e ritmos
- Ensinem sobre o as utilidades da música no culto: contrição, exaltação, comunhão, celebração, descrição, etc.
- Apresentem um panorama da música cristã brasileira
- “Des-viciem” a ideia da Gospel midiático
- Digam sobre a importância da consciência teológica na canção cristã
- “Des-levitem” o efetivo de músico e esclareçam o que de fato significa adorador
- Conscientizem para se faça arte com excelência
São algumas breves sugestões que faço, com amor e temor.
Antognoni Misael
Publicado Originalmente em: http://www.artedechocar.com/2013/08/musica-viciada-mantra-raduzido-e-isso-que-chamam-de-boa-musica-crista/#comment-3750
Intercâmbio feito por Rodrigo Ribeiro
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