terça-feira, 9 de julho de 2013

Algumas reflexões sobre o comportamento e o papel do cristão na sociedade do consumo

“Manda aos ricos deste mundo que não sejam altivos, nem ponham a esperança na incerteza das riquezas, mas em Deus, que abundantemente nos dá todas as coisas para delas gozarmos;”

1 Timóteo 6:17

                O mundo de hoje é dinâmico e acaba por solicitar de nós que o acompanhemos em cada uma das suas transformações ano a ano, de tempos em tempos. Nesse sentido e sem querer tudo demonizar e colocar a culpa no capiroto - como a religiosidade sugere, estas mudanças podem fatidicamente nos afastar de Deus. Assim, entende-se claramente que o alerta de Paulo em Efésios 5:16 Portanto, vede prudentemente como andais, não como néscios, mas como sábios, remindo o tempo; porquanto os dias são maus”. Em 1978, John Stott falando sobre o sermão do monte, afirma no prefácio de seu livro Contracultura Cristã, que se 

De fato, se a Igreja   tivesse  aceitado   realisticamente   os  seus  padrões  e  valores,   como  aqui   demonstrados,   e  tivesse   vivido segundo   eles,   ela   teria   sido   a   sociedade   alternativa   que   sempre  tencionou  ser,   e   poderia   oferecer   ao  mundo uma autêntica contracultura cristã.¹

                Anos depois deste importante escrito de Stott, uma pergunta parece pertinente: Os cristãos têm conseguido oferecer uma contracultura a dinâmica consumista na qual estão inseridos?

Para começarmos essa breve reflexão, primeiramente lembremos que a nossa sociedade advém do resultado de uma das mudanças mais drásticas vividas pelo homem chamada industrialização Os processos de produção de bens de consumo, até o início do século XVIII, eram meramente artesanais (manufatura), mas em meados do mesmo século, a Revolução Industrial inaugurava um processo produtivo que passou a ter uma produção desenfreada de forma que o estimulo quanto ao consumo foi gerados nas pessoas e finalmente com tudo isto, passamos a ser conhecidos pelo adjetivo “consumidor”. A carapuça serviu tão fortemente que o comprar passou a ser motivado pelo querer, em detrimento do que realmente é necessidade. “Esta é a sociedade que na qual o Senhor nosso Deus nos chamou para servi-lo. [...] Ser discípulo de Cristo numa sociedade de consumo é nosso desafio”, aponta Portela e Campos Jr. (2012, et al) ².

                A questão do consumismo então, passou a ser uma característica outorgada a qualquer segmento social e, a religião, que outrora era a cultura vigente que prometia a satisfação na vida do ‘porvir’, foi colocada de lado como mais uma cultura e consequentemente fora substituída pela possibilidade de uma felicidade no ‘agora’. Disto herdamos dois adágios, o primeiro mais ligado ao consumismo como meio de felicidade, que pode ser resumido como “Dinheiro traz felicidade” e o outro implícito a isto, talvez uma marca capitalista intitulado “você vale o quanto tem”. De longe essas máximas consumistas são incompatíveis com o cristianismo, mas temos sido pouco a pouco envolvidos por elas.

                No texto de 1ª Timóteo 6:17 Manda aos ricos deste mundo que não sejam altivos, ponham a esperança na incerteza das riquezas, Paulo exorta para que nosso olhar sobre tais coisa deve ser bastante diferenciado dos padrões da sociedade vigente, ele queria mostrar aos crentes ricos que o que eles possuem não os faz melhores ou mais importantes do que os demais, ou seja, nitidamente para Deus o valor do homem não se encontra naquilo que ele possui. Também não há segurança naquilo que a traça e a ferrugem destroem. Outra lição imediata está na continuação do versículo “... mas em Deus, que abundantemente nos dá todas as coisas para delas gozarmos”, onde Paulo parametriza, nas dádivas divinas a nossa felicidade, que nos leva a entender que inexiste a possibilidade de satisfação fora da presença de Deus. Assim o consumismo claramente não é a resposta para a felicidade do homem por ser efêmero e, portanto não proporciona qualquer satisfação duradoura. O interessante é que mesmo sabendo destas verdades como cristãos que somos, parecemos freqüentemente tão envolvidos e imersos na promessa de felicidade proposta pelo consumismo quanto qualquer outra pessoa.” ³ (Benton, 2002).  Isso nos mostra que grande parte dos cristãos de nossa época, além de não refutarem biblicamente a falsa ideia das promessas de felicidade terrena atreladas ao consumismo, tem pelo contrário aderido cegamente a tal estratégia, que sem sombra de dúvidas, é obra satânica com a finalidade única nos distanciar do Senhor.

Este deslize traz consigo algumas claras consequências. Por exemplo, primeiramente o consumismo tem se caracterizado como um deus, configurando de vez a ideia que em nada somos diferentes do mundo que se entrega dia-a-dia à felicidade contida na fugacidade do “aqui”. Imediatamente, atrelada a esta idolatria, outra consequência que se configura, é a de que a verdade que tanto afirmamos ser a única, tem sido desacreditada ainda mais. O consumismo é um claro sinal de que não temos crido na promessa da felicidade eterna da salvação e se nem nós temos acreditado, que dirá o mundo, inundado pelo traiçoeiro contentamento imediatista. Estes cristãos consumistas não tem uma mensagem salvadora para a sociedade, pois claramente o consumismo produziu um impacto tão grande na espiritualidade que, por meio destes, talvez até o evangelizar e o levar das boas novas, tenha perdido a credibilidade.

O caráter do cristão está posto à prova em mais um dos níveis da conjuntura social moderna e somos exatamente nós, que vivemos nesse contexto, os chamados por Deus para fazermos a diferença nessa época. Porém antes de tudo, o desafio é verdadeiramente estar satisfeito na obra de Cristo para que por meio dEle e da sua palavra possamos ser ouvidos em uma sociedade que dorme o sono da morte chamado consumismo. Nesse sentido, Deus chama esta geração para ser transformada e para transformar, não com a visão inocente de que isto mudará o mundo por completo, mas com a certeza do cumprimento no nosso papel como verdadeiros embaixadores do evangelho.


Referências

¹ STOTT, John R. W. Contracultura Cristã: A mensagem do Sermão do Monte. Prefácio. São Paulo-SP, Editora ABU, 1981. Versão digital: Fabricio Valadão Batistoni. 

² CAMPOS JR, Heber C. de; PORTELA, Solano et al. Nossa Fé: A opção Cristã – questões éticas atuais. Cap. 4. Ed. Cultura Cristã, 2012.

³ BENETON, John. Cristãos em Uma Sociedade de Consumo. Editora Cultura Cristã, 2002, pag. 42.


Felipe Medeiros

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