"O Padre Amâncio estava ali no Açu porque amava a Deus. Ouvira D.
Eufrásia dizendo: "Se Amâncio quisesse já era Bispo, um grande, um
príncipe." E não. Ficava no Açu para aguentar aquele povo, aquela gente.
Montava a cavalo para andar seis léguas com o tempo que houvesse (...) para
salvar uma alma das profundezas do inferno. Se não fosse ele, teria fugido com
Dioclécio, teria fugido com homem mais feliz do mundo. O que anda pela terra, o
que amava mulheres lindas e vira um milagre, uma força de Deus se exercendo.
Antônio Bento vacilava assim entre o Padre Amâncio e o mundo que Dinoclécio
descobrira.”.
REGO, José Lins do. In: Pedra Bonita. 14.ed. Rio de Janeiro, RJ: José Olympio, 2010, pp. 82.
Antônio Bento, protagonista desta
obra do paraibano José Lins do Rêgo, foi criado pelo amoroso, piedoso,
altruísta e dedicado Padre Amâncio. Aquele homem sempre foi seu referencial de
abnegação, amor a Deus e ao próximo. Realmente, este personagem ainda que
fictício tem traços admiráveis de devoção e compaixão. Narra o autor que ele
poderia ter ascendido na hierarquia, tornando-se se Bispo, mas preferiu
continuar na pequena cidade, sofrendo com e por aquelas pessoas.
Entretanto, certo dia, o jovem se
depara com um forasteiro, um cantador, cangaceiro, que narra histórias
incríveis, recheadas de aventuras, mulheres, milagres, e tudo num ritmo
alucinante e poético. Uma vida livre e libertina. Neste instante o referencial
do jovem é abalado. Ele passa a admirar aquele homem, até mesmo em confronto
com a imagem criada ao redor do Padre. O cantador Dinoclécio abalou o
referencial do jovem Bento. Este é o dilema desenhado no trecho do livro transcrito.
Esta perola literária nos fala
profundamente a respeito de nossa natureza humana, que parece se encantar mais
com aventuras libertinas, coisas vãs que nada contribuem para o crescimento de
outros, do que com o sacrifício pessoal, a humildade e o altruísmo sem vaidade.
É natural que o mundo, corrompido em seus pecados, não valorize e trate como
tolo aquele que atenta para as palavras de Paulo: “Não atente cada um para o
que é propriamente seu, mas cada qual também para o que é dos outros”. (Filipenses
2:4). No entanto, esta atitude é absolutamente equivocada para um cristão, que
deve valorizar muito mais homens santos, simples e humildes, do que aqueles que
se chafurdam no lamaçal do egoísmo e da vaidade, sendo bem quistos no contexto
social, mas reprovados por Deus no seu modo de agir. Neste sentido, devemos
sempre nos lembrar de nosso Mestre Jesus, que se humilhou por nós, tomando a
forma de servo e sujeitando a morte de cruz em nosso favor (Fl. 2:5-11).
Além disso, podemos observar
também o fascínio que temos pelas coisas novas, em detrimento daquilo que é
antigo, mas é sempre válido e atual. Nossa sede por novidades pode nos impulsionar,
facilmente, a sair dos trilhos da verdade, e enveredar por caminhos atraentes,
mas que na verdade são apenas areias movediças.
Por fim, ainda podemos notar que,
assim como o jovem Pedro Bento, muitas vezes pensamos e agimos como se a
felicidade estivesse na satisfação de nossos desejos egoístas, em viver de
forma livre, sem obrigações ou deveres morais, um verdadeiro “cangaço da
vontade”, até mesmo invejando os que
vivem de forma promiscua, libertina e sem qualquer pudor. Nestes momentos passamos
longe da real satisfação plena e perpetua que em está em Deus. Já dizia o
salmista: Tu me farás conhecer a vereda da vida; na tua presença há plenitude
de alegria; à tua mão direita há delícias perpetuamente. (Salmo 16:11)
Que esta reflexão abra nossos
olhos para que valorizemos sempre aqueles que são piedosos, ainda que não populares
e glamorosos; aqueles que estão arraigados em valores antigos e eternos, ainda
que o mundo os considere ultrapassados e anacrônicos; e saibamos que a nossa
alegria não está na satisfação dos desejos meramente carnais, no nosso egoísmo,
na nossa lascívia e no desejo insaciável de novas aventuras, mas sim,
encontramos a plena satisfação em Deus. Que possamos dizer como o profeta: “me
alegrarei no SENHOR; exultarei no Deus da minha salvação” (Habacuque 3:18).
Rodrigo Ribeiro
@rodrigolgd
Ótima reflexão Rodrigo!!
ResponderExcluirVai para o Arte de Chocar!!!
Choquemos juntos, mano! =]
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