Só Deus sabe
realmente quais são, de fato, santos e eleitos seus, conseqüentemente, até onde
nos era do interesse conhecê-la por sinais seguros, e como que marcas, no-la
assinalou o Senhor. Esta é, na verdade, singular prerrogativa do próprio Deus: saber
quem são os seus, como Paulo cita [2Tm 2.19]. E, com efeito, para que a esse
ponto a temeridade dos homens se não se arrojas, foi de antemão visualizado,
reiterando-o diariamente a própria eventuação, quão longe seus juízos secretos
nos superam o entendimento. Ora, também aqueles que pareciam inteiramente
perdidos, e haviam sido pranteados como além de toda esperança, são por sua
bondade recambiados ao caminho; e os que acima de outros pareciam estar de pé
amiúde se prostram arruinados. Sendo assim, segundo a predestinação secreta de
Deus, como diz Agostinho, “muitas são as ovelhas do lado de fora, muitos são os
labos do lado de dentro”. Pois Deus conhece, e os tem marcados, os que não
conhecem nem a ele, nem a si próprios. Mas, daqueles que trazem às claras sua
marca, unicamente seus olhos vêem os que não apenas são santos sem dissimulação,
mas também hão de perseverar até o fim [Mt 24.13], o que é, afinal, o clímax da
salvação.
Por outro
lado, entretanto, porque previa ser-nos até certo ponto conveniente que
soubéssemos quem fosse de nos ter por seus filhos, nesta parte ele se acomodou a
nossa capacidade de entendimento. E porque não era necessária a certeza da fé, pôs
em seu lugar um como que juízo da afeição, mediante o qual reconheçamos por membros
da Igreja aqueles que pela confissão de fé, pelo exemplo de vida e pela participação
dos sacramentos, professam conosco o mesmo Deus e Cristo. Mas o conhecimento do
próprio corpo, quanto mais sabia ser necessário para nossa salvação, tanto mais
o recomendou por certas marcas.
CALVINO,
João. As Institutas da Religião Cristã: capítulo 1, Livro IV, pag. 34
Felipe Medeiros
@felipe_ipb
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