“Dois terços dos missionários ativos são
casais casados. Outro terço são mulheres solteiras. O resto são homens
solteiros.”
Isso não é exatamente uma estatística,
propriamente dita. É um sentimento, e algumas vezes uma brincadeira feita por
líderes de agências missionárias, e mais recentemente, por um monte de
solteiros de vinte e poucos anos em minha sala de estar. É um sentimento que
revela uma verdade impressionante sobre o trabalho missionário hoje em dia: há
muito poucos homens solteiros escolhendo ir.
A verdadeira estatística é essa:
para AIM¹ e outras organizações similares, algo aproximadamente entre 80 e 85
por cento de todos os missionários solteiros são mulheres. Para cada 10
solteiros enviados, apenas 2 são homens. A disparidade é grande o suficiente a
ponto de haver uma enorme lacuna em muitos campos missionários. Está faltando
homens, e por isso um grupo de mulheres tem assumido o trabalho. Às vezes
fazendo trabalhos em que a presença masculina seria mais recomendada.
Por que existe tão grande
diferença entre homens e mulheres que escolhem fazer missões em seus anos de
solteiros? E por que isso importa?
Estatísticas e dados demográficos
são uma forma humana de mensurar algo. Talvez Deus esteja simplesmente
dirigindo mais mulheres às missões do que homens – é como se Ele chamasse mais
pessoas de Michigan do que de Nova Yorque (ou Ele chama mesmo?). Mas talvez
haja algo por trás dessa tendência. Talvez haja algo diferente que nossas
igrejas e agências missionárias possam fazer. E talvez haja alguns homens que
precisem seres despertados e chamados.
A maioria dos solteiros se
envolvendo com missões hoje em dia são muito novos, parte da geração conhecida
como os “mileniaristas”. Eu não sou jovem, nem solteiro. Então, a fim de compreender
melhor a questão, convidei à minha casa meia dúzia desses jovens com a promessa
de uma refeição caseira e uma noite animada, possivelmente com uma conversa
inquietante. O grupo consistia em três homens solteiros e três mulheres
solteiras, cujas idades variavam de 22 a 30 anos. Todos missionários efetivos
na África.
Muito tem sido dito acerca dessa
geração e não sou o primeiro a refletir se algo está indo errado. Há uma vasta
quantidade de escritos e até mesmo pregações lamentando a diminuição da
participação de homens na sociedade moderna e na igreja. Mark Driscroll, pastor
titular da Igreja Mars Hill em Seattle pontua isso abruptamente (como ele
geralmente faz): “A pessoa menos provável de se ver na igreja é um jovem rapaz
solteiro de vinte e poucos anos”. Por coincidência (ou seria por consequência?)
essa é também a pessoal menos provável de se ver no campo missionário.
Uma Tendência Cultural
Distraído, cheio de si, sem
motivação, apático. Se você fosse procurar adjetivos que descrevam a geração
mileniarista, esses são algumas das descrições comuns que surgiriam. Eu
coloquei isso, timidamente, em nosso grupo de discussão e perguntei se eles
concordavam. Fiquei surpreso ao ouvir um alto “sim”.
Cada vez mais conectados, os
mileniaristas tem o mundo ao alcance dos seus dedos, entretenimento em toda
esquina e expectativas de que as coisas deveriam ser mais simples- tão simples
quanto um click. Apesar dessa massiva conexão virtual, eles estão crescendo
cada mais entediados, desconectados e apáticos. Os homens em particular
estendem os seus desejos de adolescência, e tanto homens quanto mulheres
atrasam o casamento. Eles trocam de empregos frequentemente, vão à igreja com menos
fervor; contudo, “postam” de forma prolífica acerca do que está errado com o
mundo.
Driscroll percebe isso na igreja
da seguinte forma: “O pecado notório dos garotos cristãos hoje em dia é se
preocupar mais acerca das coisas do que tentar fazer algo.”
Benjamin Brophy, em um artigo
intitulado “My Generation’s Disease” (A Doença da Minha Geração), colocou a
questão da seguinte forma: “Mileniaristas querem mudar o mundo, mas eles sentam
e esperam que a oportunidade de mudar o mundo seja dada a eles. O clichê é:
queremos salvar o mundo, mas queremos fazer isso por trás da tela de um
computador”.
Nosso grupo em foco utilizou a
recente campanha “Kony 2012” como uma ilustração. O vídeo documentário expondo
o chefe de guerra Joseph Kony e as atrocidades que ele cometeu na África
Central se tornou um viral massivo em 2012 – largamente devido ao ultraje moral
dos mileniaristas.
“Então muitos foram despertados” nosso grupo
disse, “mas tudo o que eles fizeram foi compartilhar o vídeo. Eles não tinha
ideia de que isso estava acontecendo por anos, e agora, ninguém fala mais sobre
ele.”
“Essa não é uma mudança duradoura”, uma das
jovens mulheres acrescentou, “Isso apenas faz você se sentir melhor”.
Eu perguntei ao grupo se o mundo
poderia realmente ser mudado com um click. Sim, eles disseram, como
mileniaristas, tem testemunhado essas coisas em primeira mão durante o período
de vida deles. Então eu os perguntei se discípulos poderiam ser feitos com um
click.
“Leva tempo para construir relacionamentos,
estar na vida das pessoas, e entender uma cultura é muito mais difícil do que
clicar um botão”, uma mulher argumentou. “Eu não conheço muitos jovens que
estejam dispostos a se meterem em situações como essa. Isso é realmente muito
difícil. Discipulado requer relacionamentos reais, compromisso e sacrifício.”
Isso poderia ser parte do que está
afetando a participação dos mileniaristas em missões, e se for, isso é um fator
maior para homens? Os homens são mais apáticos do que as mulheres? Até mesmo
para tentar responder isso, nós teríamos primeiro que definir o que é
masculinidade, ou de preferência, como ela é percebida.
A questão dos papéis de gênero
tem mudado para essa geração e o nosso grupo tinha muito a dizer acerca dos
efeitos em seus colegas de idade no que diz respeito ao que a cultura e a mídia
ensinam sobre masculinidade.
Há 50 anos atrás, as mulheres no
Ocidente fizeram grandes ganhos. Hoje, mais mulheres do que homens conseguem se
formar na faculdade, com notas melhores e mais confiança do que os homens de
suas classes. Elas são mais suscetíveis do que os homens a irem para faculdade
e muitas ganham salários mais altos do que eles no mercado de trabalho. As
mulheres estão sendo ditas que podem conquistar qualquer coisa e muitas tem
perseguido essa promessa. Os homens, por outro lado, estão sendo ditos o
contrário.
À medida que as mulheres tem
ganho mais igualdade, os homens tem sido desvalorizados. Definido como a
“efemização da cultura”, nós estamos vivendo em meio a uma mudança cultural em
que os homens são vistos cada vez mais como menos importantes no esquema das
coisas. A mídia toma essa percepção e a codifica. Assim, uma geração ensinada
em massa através da mídia cresce acreditando nisso.
Como Owen Strachan escreveu no
blog do The Gospel Coalition, “Os homens hoje estão em apuros. Os garotos tem
sido ensinados por incontáveis fontes e mídias que eles são inerentemente mais
débeis, tolos e inferiores às mulheres. Os garotos se envolvem com meninas,
fogem de suas responsabilidades, não levam as coisas sérias a sério e
geralmente negligenciam as grandes oportunidades que lhes são postas.”
É possível que esses homens mileniaristas
estejam simplesmente fazendo jus às baixas expectativas que a cultura lhes tem
imposto?
O nosso grupo de discussão foi rápido
em culpar os lares sem pais. Antes uma anomalia, pais ausentes – como resultado
de divórcio, negligência ou até mesmo trabalho demais – são hoje uma epidemia.
Como resultado, inúmeras crianças crescem sem um modelo balanceado ou instrução
acerca dos papéis de gênero. Os garotos aprendem sobre masculinidade com a
mídia ou seus colegas, mas não dos seus pais.
Driscroll diz que isso leva a um
certo tipo de “adolescência estendida”, na qual garotos continuam agindo como
tais ao longo dos seus vinte anos. “Em uma cultura de consumo, masculinidade
termina sendo definida pelo que você consome, não pelo que você produz. Os
homens se tornam consumidores auto absorvidos de aparelhos eletrônicos, jogos e
mulheres. O que mata os jovens rapazes é o pensamento de que a adolescência
estendida é aceitável e inevitável.”
Inevitável. Essa é uma palavra
curiosa. Será que os homens mileniaristas são vítimas involuntárias da
tendência cultural contrária a eles? Eles estão sobrecarregados com uma
angústia geracional, perda de modelos e a morte da masculinidade. Mas e a
Igreja? Ela não está se posicionando em meio à lacuna, como uma força contra
cultural?
Um Evangelho Tímido
Em um artigo da Revista Biola
intitulado “The Feminization of the Church” (A Feminização da Igreja) nós
aprendemos que as coisas não foram como a contracultura que você esperaria.
Pollster George Barna se refere
às mulheres como “a coluna vertebral das congregações cristãs na América.”
Majoritariamente 60% da igreja é constituída por mulheres, e os homens que a
frequenta são menos ativos – menos prováveis de participar da escola dominical,
pequenos grupos e cultos. Como resultado, a mensagem e os ministérios da igreja
tendem a serem dirigidos às mulheres.
Os homens em nosso grupo
concordaram, “A espiritualidade está ligada a sentimentos e emoções. Os garotos
são distanciados por isso. Essas coisas não são vistas como viris e se um
garoto não está na igreja, muito menos estará envolvido com missões.”
Mike Erre, um director de ministério
para homens em uma grande igreja da Califórnia, argumenta que a mensagem da
igreja não está mais ressoando aos homens. “O Evangelho que Jesus e Paulo
pregou é revolucionário e é digno de darmos nossas vidas por ele. Mas parte das
razões pelas quais os garotos não estão envolvidos é porque temos vendido um
Evangelho tímido. Nós não o pintamos como grande o suficiente – ou Deus como
maravilhoso o suficiente – a ponto de ser constrangedor.”
A feminização da igreja reflete a
feminização da cultura maior e eu reflito até que ponto isso influencia em
missões. Certamente a Grande Comissão é muito constrangedora, ousada e até
mesmo revolucionária. Mas se a Igreja não apresenta a vida cristã em uma
perspectiva balanceada – afirmando as forças de tanto homens quanto de mulheres
– então como eles apresentarão um chamado a missões?
E quanto às agências de missões?
Uma das mulheres em nosso grupo serve como a coordenadora de novos missionários
em uma organização parceira da AIM. Ele argumenta que os homens não tem ideia
das oportunidades diante deles, “Setenta por cento das nossas vagas são
preenchidas por mulheres”, ela disse, “porque elas focam em mulheres, crianças,
educação, enfermagem... a percepção em massa é que o que está disponível é para
ser feito é relacionado a carinho.”
Embora muito do trabalho
missionário seja carinho, como temos vistos, discipulado requer relacionamentos
e até mesmo relacionamentos requerem carinho. Mas esses mesmos relacionamentos
requerem um certo nível de risco, ousadia, e o mais importante, um cenário em
comum sobre o qual será erguido. É difícil, senão impossível, para jovens
mulheres ministrarem a homens em muitos contextos transculturais. Para
incontáveis homens na África que precisam ouvir a Palavra e aprenderem a ser
seguidores de Cristo, apenas outro homem pode lhes mostrar o caminho.
Há provavelmente centenas de
buscas masculinas que podem oferecer acesso a esses tipos de oportunidades de
discipulado. Os jovens rapazes vagando pelos bancos da Igreja do Ocidente já
ouviram alguma vez falar sobre isso? Quanto deles já visitaram o site de alguma
agência missionária?
Uma Estrada Difícil
Apesar da pressão negativa da
cultura e a morna inspiração da Igreja, homens solteiros podem também estar em
desvantagem ao realmente irem ao campo e possivelmente florescer enquanto estiverem
lá.
Expectativas culturais
desempenham um papel. Um dos homens em nosso grupo resumiu isso como uma
simples questão de “dinheiro e orgulho”. Os homens carregam um fardo maior do
que o das mulheres de serem provedores e membros autoconfiantes da sociedade.
Contudo, ao seguirem o chamado para missões, eles são levados a abraçar uma
vida de dependência e até mesmo a probabilidade do que alguns poderiam
considerar “carreira suicida”; tudo por fazer um trabalho que muitos em casa
poderiam não entender. Esse afastamento das expectativas culturais irá sem
dúvidas desafias o orgulho de um homem e poderia também ser percebida como um
risco colossal.
Relacionado ao orgulho está o
medo de falhar, na vida ou ministério ou em ambos. Alguns tem sugerido que as
mulheres solteiras são naturalmente melhor equipadas para lidar com as
generalidades da vida no campo. O trabalho missionário tende a ser relacional e
sem estrutura. É cheio de ambiguidades em que um rapaz poderia preferir um
plano de ação e isso não os leva a soluções fáceis como fazer uma ida a Home
Depot². Além disso, há a questão da pureza sexual, indiscutivelmente mais
difícil para homens solteiros do que para mulheres.
Pode ser verdade que missões
requer mais dos homens, mas como o Driscroll martela para fora do seu púlpito
em um sermão sobre masculinidade bíblica, “Verdadeiros homens não estão
procurando o caminho de menor resistência, mas o caminho de maior glória para
Deus”.
Um Chamado à Ação
Enquanto muitos homens estão
evitando o caminho quando ele requer uma volta inesperada em direção ao
trabalho missionário, as mulheres estão muito mais prontas para seguir em
frente. Elas também são rápidas em perceber que isso não é uma boa coisa. Não é
bom para o desequilíbrio das necessidades ministeriais no campo. Não é bom para
as muitas mulheres que servem solteiras durante toda vida, escolhendo um
chamado ministerial ao invés de uma família devido à falta de homens que
compartilhem a mesma visão que elas. Também não é bom para os homens a quem
Deus tem chamado, que um dia poderão olhar atrás e perceberem ressentidos que
perderam a maior oportunidade de suas vidas.
Igrejas e agências missionárias
podem estar em falta com isso, e nós temos que reconsiderar a visão da qual
estamos lançando mão (ou falhando em fazer) de jovens rapazes em nosso meio
pela Grande Comissão. Há custo e perigo em seguir a Cristo e homens são
trabalhados por Deus a responderem a tais coisas.
Eu sou lembrado da gentil, porém
sóbria exortação na epístola de Primeira João que expõe o conflito do cristão
com o mundo, a carne e o diabo. “Eu vos escrevo,” o autor desafia, “... pais,
filhos, jovens rapazes.”³
Nós poderíamos facilmente
carregar mais essa cobrança – a todos os envolvidos no movimento missionário
moderno:
Eu vos escrevo, Igreja, porque
você sustém uma mensagem revolucionário e só precisa expô-la.
Eu vos escrevo, agências
missionárias, porque vocês conhecem a paisagem e precisam traçar um caminho.
E eu vos escrevo, jovens rapazes,
porque nós precisamos de você.
Sim, isso pode ser mais difícil
para você. Difícil de abandonar as mentiras e a apatia. Difícil de prover um
sustento e ser autoconfiante na sociedade. Difícil de entrar em relações
dirigidas de forma transcultural. Difícil de encontrar o seu ministério em sua
vocação. Mas o Evangelho precisa de homens. A vida cristã pode ser uma batalha,
tanto que a Bíblia nos manda vestirmos uma armadura. O campo missionário é um
campo de batalha, onde as forças e paixões de um homem são chamadas para serem
gastas pela maior causa que a criação já conheceu: a causa de Cristo e a sua
obra redentora para salvar este mundo. Isso requer coragem – coragem para sair
da sonolência e entrar na briga. Isso requer humildade – para estar disposto a
falhar ou pelo menos ser considerado um fracasso pelos seus colegas. Por fim,
isso requer coragem – mais do que você tem, mas não mais do que a que Deus lhe
dará.
“Jovens, eu vos escrevi, porque sois fortes, e a
palavra de Deus permanece em vós, e tendes vencido o Maligno.” (1 Jo 2.14)
1. 1 AIM
é uma agência missionária americana que atua na África
2. 2 Home
Depot é uma loja de departamentos americana
3. 3 Em
todas as traduções da Bíblia para o inglês o termo “jovem” em 1 João 2 é “Young
Man”, que pode ser traduzido como “jovem rapaz”, especificando que os
destinatários não eram jovens em geral, mas jovens homens.
Mike Delorenzo
Texto traduzido por: Igor Sabino
Facebook: https://www.facebook.com/igorhsabino
Publicado Originalmente em: http://next-mission.com/2013/05/14/men-of-mission-video/
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