Organizar a fé em sistematizações ou
resumi-la em credos não é algo somente dos séculos XVI em diante, os judeus
usavam a Shema (duas primeiras seções da Torá) para professar a sua fé (exemplo
encontrado em Deuteronômio 6:4-9). As varias declarações de fé encontradas no
Novo Testamento (João 4:42 , 6:14, 6:69) além do Credo Apostólico datado dos
primeiros séculos da igreja cristã que tinha função pedagógica para o batismo
dos novos na fé e para combater as heresias da época.
Após o marco da Reforma Protestante,
em 31 de Outubro de 1517, o cristianismo teria a sua principal divisão em
função dos abusos encontrados em diversos pontos da doutrina da Igreja Católica
Romana e embora Lutero inicialmente não tivesse a intenção se fundar uma nova
religião, mas sim purificar a igreja de tais desvios e para que ficassem claras
as intenções de Lutero, as 95 teses constituíam a exposição publica e escrita dos
desvios. Contudo, a resposta protestante aos abusos da ICAR gradualmente foram
copilados nos Cinco Solas e também no moto Ecclesia Reformata et Semper Reformanda Est. Posteriormente as
confissões de fé Belga (1561), Catecismo de Heidenberg (1563), Segunda
Confissão Helvética (1566), Cânones de Dort (1618-1619), Confissão de Fé de
Westminster (1647) e seus Catecismos Maior e Menor (1648).
Augustus
Nicodemus fala que comumente alguns dos lemas reformados são usados e
entendidos de maneira diferente em nossos dias, por exemplo o moto Ecclesia
Reformata et Semper Reformanda Est (A Igreja é
reformada e está sempre se reformando). Nicodemus diz que o holandês
calvinista Gisbertus Voetius (1589-1676), que escreveu tal moto na época
do Sinodo de Dort, dificilmente estava se referindo a ‘igreja estar sempre
mudando’, de forma que a voz passiva do “Ecclesia Reformata” lembra que o agente da reforma não é a igreja, mas
sim o Espírito Santo, que leva os cristãos às Escrituras, entendendo que a
verdade não muda [1] . Mas em nossos dias não é bem assim que acontece. Evocando
para si a justificativa de que a igreja “está sempre se reformando”, as mais
variadas aberrações entraram na igreja com a interpretação errônea que isto
significava novas interpretações que não tem nenhum comprometimento com as
Escrituras.
Toda falsa doutrina tem como principal
argumento o recebimento de novas revelações da parte de Deus, ou seja, começam
então a negar o Só a Escritura e
assim ao contrário do que pensam ser o progresso da igreja, voltam as práticas
da ICAR e regressam a uma situação de obscuridade da qual contrasta fortemente
com a iluminação do Verdadeiro Espírito que nos chama a Palavra e somente a
ela. A falta de apego confessional deságua na livre interpretação pessoal dos
textos bíblicos e não na livre consulta (CFW cap. 1. V), porém é necessário não
menosprezar a história da Igreja, onde os Pais da Igreja se esmeraram para
explicar passagens e fundamentar a fé cristã, inclusive não rejeitando a
doutrina apostólica, mas se apoiando nela.
É obvio que a subscrever uma
confissão não é incoerente, a Bíblia é infalível, as confissões não. A
autoridade das confissões é vinda da própria Bíblia, por isso ser confessional
significa entender que tal confissão é a interpretação mais harmoniosa do
Sagrado Texto e isto não coloca a confissão acima das Escrituras nem deixa de
lado o lema Só a Escritura. Joel Beeke cita que os primeiros reformadores reconheciam
o serviço que as confissões prestavam à igreja na adoração (tarefa doxológica),
o testemunho (tarefa proclamadora), o ensino (tarefa didática) e a defesa da fé
(a tarefa disciplinadora), ou seja, nas confissões a igreja declara no que ela
crê [2].
Sérios desvios doutrinários como o
arminianismo, adventismo, mormonismo, liberalismo, neopentecostalismo e etc.
tem aparecido pela falta de apego às confissões reformadas. Os Cânones de Dort,
por exemplo, foram os cinco artigos escrito contra os seguidores dos ensinos de
Armínio. Eles foram elaborados em 154 sessões durante sete meses, rejeitado os
ensinos dos remonstrantes. Uma volta no arminianismo, em função do pentecostalismo,
não teria ocorrido se fosse levado em conta o trabalho do Sínodo de Dort. Talvez
fosse possível evitar a força que neopentecostalismo tem desde Charles Finney. Não
obstante Ellen G. White não teria influenciado com seus escritos a volta às
praticas da lei cerimonial e civil de Israel por parte do adventismo, quem sabe
Joseph Smith Jr tivesse suas duvidas sanadas antes das mesmas o levar a fundar
a religião mórmon ou mais talvez ainda mais importante nos nossos dias, o
liberalismo teológico fosse apenas uma clara blasfêmia contra Deus.
Claramente o abandono das confissões
da época da reforma constitui um perigo que nos fez chegar até o atual quadro
de caos no meio evangélico. Somos filhos de um retorno efetivo às Escrituras,
principalmente com Lutero e Calvino, mas claramente a ausência literal ou
funcional do apego as confissões reformadas como o trabalho da vida dos
reformadores e dos Pais da Igreja, nos tem feito perceber a necessidade da ‘igreja
ser reformada e sempre se reformar’. Não nesse sentido em que a Palavra é
diluída nos achismos das seitas, mas no sentido de volta às Escrituras guiada
pelo Espírito Santo.
É importante frisar que não se trata
de tornar qualquer confissão um ídolo, mas sim tentar abandonar o ídolo da
interpretação particular das escrituras, ou seja, o ídolo do “eu”. Não há
duvidas que o espírito deste século tem usado de estratégias que se valem do
argumento da comparação das confissões com a tradição romana, para diminuir
obra do Espírito ao longo da história da igreja. Confissão alguma tem caráter
igual ou superior às Escrituras, inclusive as próprias confissões claramente
expressam a inerrância bíblica, algo que tanto a tradição católica nega (igualando-se
a Palavra) quanto os líderes carismáticos que negam efetivamente com suas novas
revelações e interpretações, a autoridade bíblica.
Um cristianismo confessional sem
dúvida expõe mais do que um credo aos de fora da comunhão, o cristianismo confessional
tem contribuído para que os próprios cristãos sejam mais conhecedores da
Palavra e não sejam levados por qualquer vento de doutrina que se proliferam
aos montes à medida que a volta de Cristo se aproxima. Que Deus nos dê a graça
de poder encontrar na Sua Palavra a verdadeira espada do Espírito!
[1] Disponível em < http://tempora-mores.blogspot.com.br/2006_04_01_archive.html>
[2] BEEKE, Joel R. Vivendo para a glória de Deus. Capítulo 2: pág. 35.
Editora Fiel, 2010.
Felipe Medeiros
felipealexandremedeiros@outlook.com
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